Crítica | “Star Wars: Episódio VIII – Os Últimos Jedi”, de Rian Johnson

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Chega-nos finalmente a aguardada sequela de “O Despertar da Força” nas mãos de Rian Johnson: “Star Wars: Os Últimos Jedi”.

Finalmente temos um vislumbre do futuro, e sob esta orientação meticulosa, “Os Últimos Jedi” transforma as restrições de um blockbuster num Cavalo de Tróia repleto de reviravoltas e surpresas cinemáticas recheadas de sofisticação narrativa. O resultado é: o filme mais satisfatório com o qual poderíamos sonhar.

A filmografia de Johnson torna fácil o reconhecimento da sua “voz” na realização, o que faz dele num filme de autor. Sendo este o caso, o argumento tem um peso e valor enormes. O argumento de Johnson brinca com as expectativas dos fãs e executa truques estruturais inteligentes e mudanças tonais semelhantes aos seus trabalhos anteriores como “Brick”, “Os Irmãos Bloom” e “Looper – Reflexo Assassino”. Contudo, é por usar uma linguagem do cinema blockbuster e clarificando as suas ambições, que Johnson derruba tudo alguma vez feito no meio.

O filme manipula a Resistência a fugir e a confrontar os seus inimigos (A Primeira Ordem) que estão numa implacável perseguição, enquanto que  viajamos até maravilhosos planetas com peculiares criaturas e duelos de lightsaber que deixarão qualquer fã da saga, e do cinema de ação, babados.

Esta é também uma declaração sagaz do seu talento graças ao sucesso das diferentes aventuras que mantêm a história concisa e todos os personagens ativos. Claro que Os Últimos Jedi” tem também que avançar a mitologia de Star Wars a um ritmo constante. “O Despertar da Força” termina ao tirar-nos o chão , com a destemida mas ainda inexperiente, Rey (Daisy Ridley) a encontrar o ermita Luke Skywalker (Mark Hamill) no isolado planeta Ahch-To.

Com a Primeira Ordem a apontar os seus enormes canhões aos rebeldes, Poe Dameron (Oscar Isaac) entra a atacar a frota inimiga liderada pelo General Hux (Domnhall Gleeson) num prólogo repleto de ação espacial que espelha toda a tensão refletida no filme para que Johnson possa despachar o espetáculo inicial para que possamos ir ao encontro do filme anterior.

Enquanto que há bastante discussão sobre os aspetos espirituais da Força, assim como as justificações filosóficas de lutar nas alturas mais desesperadas, Johnson mostra não ter medo de trazer ao de cima o valor do entretenimento que sempre encontramos neste tipo de cinema, reconhecendo aspetos essenciais da saga e mudando a perspectiva que temos sobre certos elementos do universo, da sua mitologia e personagens.

Começando com um surpreendente espectáculo de luz e cor nos primeiros minutos, o filme nunca nos deixa sossegar, juntando a esperada tradição cinematográfica com a sua sensibilidade de realização, que tem raízes nas ambições originais de George Lucas e no cinema avant-garde.

Vemos os rebeldes a fugir da Primeira Ordem até ao momento que se apercebem que estão encurralados, aqui a massa do filme divide-se em duas partes: a luta dos rebeldes pela sobrevivência sob o comando de Leia Organa (Carrie Fisher), que nos oferece a sua melhor prestação no ecrã naquele que é o seu último papel, e os esforços de Rey para convencer o teimoso Luke que a galáxia precisa do seu poder. Claro que tudo isto são pilares que vão dar teto ao confronto que já esperávamos, mas nem os maiores fãs da saga (Eu mesmo) conseguirão adivinhar como lá chega “Os Últimos Jedi”.

O filme rapidamente resolve o final de “O Despertar da Força” e ainda complica algumas histórias já em curso. Tudo isto acontece apenas na primeira hora, assim como uma magnifica exploração psicológica da ligação que Rey e Kylo Ren têm com a Força.

Embora Rey esteja a maior parte do tempo numa ilha remota, ela interage com Kylo Ren através de uma série de sequências que exploram a Força de uma forma tremendamente original e que é dos elementos mais audazes que Johnson usa para contar a história, resultando numa das mais fascinantes abordagens do conceito já vistas na saga, ou em cinema, ponto.

Com esta exploração de Kylo e Rey como personagens numa juventude de alianças incertas, Johnson consegue ainda encaixar sequências psicadélicas que aprofunda o mistério. Ambos os personagens encontram-se num espaço de ambiguidade moral, como destinos entre cruzados, mais uma vez uma manobra audaz que os junta mas também os afasta em contextos para lá dos literais e físicos.

Mas não se preocupem, os duelos de lightsaber chegam a seu devido tempo. “Os Últimos Jedi” mostra claramente de onde tira as suas referências no que toca às sequências de ação, e poderemos ver as mais óbvias imagens recriadas do cinema japonês em clássicos como os de Kurosawa e Takashi Miike. Contudo, há uma imensa felicidade quando vemos Fisher e Hamill a reencarnar os seus icónicos personagens como versões veteranas daqueles que tanto adoramos, mesmo que o foco crescente seja entre Rey e Kylo Ren.

Johnson cede eventualmente à obrigação comercial que vem com este tipo de cinema para apelar aos mais novos, mas mesmo aí não perde qualquer potencial. Enquanto que Rey e Luke se conhecem pouco a pouco, Finn (John Boyega) faz uma nova amizade em Rose Tico (Kelly Marie Tran), uma valente mecânica que se junta ao antigo stormtrooper na procura de um hacker que poderá evitar que a frota rebelde seja destruída pelos seus inimigos.

A rebeldia e o desejo pela aventura de Rose igualam as ambições crescentes de Finn, e a química entre os dois pode bem vir a representar um ponto de viragem histórico na representação em filmes blockbuster. Tirando isto, os dois marcam a tangente menos cativante do filme, uma aventura no casino de “Canto Bight” que faz lembrar uma versão sci-fi de “Ocean’s Eleven – Façam as Vossas Apostas”.

É assim que encontram DJ (Benicio Del Toro) que é precisamente o hacker que procuravam, no fim de contas parece quase um elemento a mais, tal como tantos outros elementos em “Os Últimos Jedi”.

A forma com que a história nos é entregue é de uma riqueza tão singular que faz com que cada pormenor se encaixe como um magnificente puzzle.

Como é habitual, o universo “Star Wars” está lotado de imaginação, sejam eles belíssimas raposas de gelo ou os fofos Porgs, sejam as pequenas aves que acabam por criar uma  ligação com o adorado Chewbacca (Peter Mayhew).

Johnson acaba por não permitir a sua interferência nos eventos mais espetaculares da sua odisseia, fazendo deles uma oportunidade para respirar no meio de temáticas pesadas e emocionais, de certa forma são um intervalo para que possamos sentir um pouco de alegria até que… o que viemos realmente assistir recomece.

São poucos os filmes que cumprem tanto aquilo que prometem, e uma das promessas cumpridas chega-nos no terceiro ato de uma forma épica e impossível de descrever de forma fiel, de tal forma que prefiro não me pronunciar sobre o assunto e deixar-vos desfrutar de forma plena quando virem o filme. Ainda antes, há uma inesperada aliança que se forma por momentos e que embora não nos diga nada sobre alianças futuras trará à memória, da melhor forma possível, alianças passadas.

O maior feito de Johnson é que enquanto honra a necessidade da história em sublinhar pontos familiares, o realizador fornece uma reignição na forma de como a contar. Desde que misturou as sensibilidades do film noir com dramas de liceu em “Brick”, Johnson mostra agora como consegue pegar em convenções clássicas e dar-lhes nova prespetiva. Com “Os Últimos Jedi” fá-lo ao mais alto nível.

Muito se tem feito com cineastas independentes a serem lançados para a máquina de franchises, com isto perderam a sua autonomia e voz. Mas Johnson é agora uma razão para manter a ansiedade e desejo de ver a saga a cescer e expandir, ainda mais com a notícia que será responsável por criar a sua própria triologia original. A sua capacidade de oferecer um tão inovador e tão envolvente filme na saga icónica diz-nos que todo o contador de histórias tem a capacidade de dar esperança aos autores do futuro.

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