Listen | Realista, relevante e de extrema sensibilidade humana

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Vencedor de 6 prémios no Festival de Veneza, “Listen” está a ter um merecido destaque nos meios de comunicação.

Esperemos que esse destaque produza mudanças, pois também em Portugal estas situações acontecem…

“Listen” é sem sombra de dúvidas um dos filmes mais realistas e relevantes do ano e não é por 2020 ser um ano de menos estreias. Semelhante a filmes de Ken Loach como “Sorry We Missed You” e “I, Daniel Blake”, esta história retratada pela portuguesa Ana Rocha de Sousa (em estreia numa longa-metragem) é um conjunto de elementos de várias histórias verídicas, que em conjugação apresentam-nos uma narrativa que apesar de no seu todo ser fictícia, cada pormenor é verdadeiro.

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A realizadora não quis fazer deste filme um porta-estandarte de uma ‘família mártir’ cuja mediatização ajudasse a colocar o foco apenas no seu caso. Isso poderia inclusivamente ser contraproducente para a causa.

Em “Listen” temos uma família que representa o problema geral de todas as famílias que se tornam vítimas deste sistema social e judicial que prejudica mais do que ajuda. Um sistema avariado, que precisa há décadas de ser renovado, mas que por um labirinto de burocracias a mudança nunca chega.

E não é por este filme se passar no Reino Unido, que diz apenas respeito aos problemas de lá. Muito pelo contrário, “Listen” leva-nos a refletir nas tantas histórias que já ouvimos por cá, de famílias pobres que pedem ajuda ao estado, mas que em vez de receberem apoio, vêem os seus filhos serem-lhes retirados dos braços por assistentes sociais que os levam para o muito lucrativo sistema de adoções.

Em alguns casos, as mães nem chegam a sair do hospital com o bebé nos braços, que ele já lhes foi retirado. Mães que com uma ajuda monetária cuidariam dos seus filhos com todo o amor do mundo. Mas neste sistema a ajuda monetária não traz nada aos bolsos de quem nele trabalha, enquanto uma adoção pode sempre trazer um bónus, uma comissão… Quem é que consegue recuperar o seu filho de um sistema que só lucra se ficarmos sem ele?

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Enfim, regressando ao filme, “Listen” apresenta-nos um casal português emigrado no Reino Unido. Entre a mãe, que trabalha como empregada de limpezas, e o pai, cujo chefe demora a conseguir pagar os salários, as circunstâncias da vida fazem com que precisem de ajuda para pagar as contas e alimentar os três filhos (um rapaz pré-adolescente, uma menina praticamente surda e uma bebé de alguns meses), vendo-se obrigados a recorrer aos apoios dos serviços sociais. Longe estavam de imaginar que isso colocá-los-ia na mira do sistema, à procura da mais pequena falha para lhes tirar os filhos e iniciar um processo de adoção forçada.

Isto até pode parecer uma demonização da assistência social, mas a realidade é que, mesmo com inúmeras famílias a receber um precioso auxílio sem razões de queixa, nada apaga o facto de que certas famílias são destruídas e despedaçadas por decisões extremamente erradas, que em nada têm a haver com o verdadeiro bem-estar das crianças, esse sim, o fator mais importante de qualquer equação.

A realização e argumento de Ana Rocha de Sousa exploram o tema de forma precisa e sucinta, em apenas 1h 13min, de extrema sensibilidade humana. Com Lucia Moniz e Ruben Garcia com uma tristeza e pânico palpáveis na pele deste casal que como o poster e o trailer do filme indicam, pouco têm e ainda lhes retiram tudo. Cada lágrima, cada frustração, cada abraço é sentido.

Um filme sóbrio, sem artifícios, que vai diretamente ao assunto, que precisa de ser visto e que vale a deslocação à sala de cinema.

“Listen” encontra-se em exibição em mais de 50 cinemas em Portugal.

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