Quando Scary Movie tornou-se um fenómeno de comédia no início dos anos 2000, ninguém esperava que a continuação, Scary Movie 2, quase chegasse a ter um dos maiores nomes do cinema a participar, em jeito de cameo. Marlon Brando, lenda de Hollywood e vencedor de dois Óscares, assinou inicialmente para interpretar o padre que parodia The Exorcist, mas problemas de saúde impediram-no de prosseguir. A produção chegou a ponderar uma hipótese ainda mais surpreendente, o ex-Presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, como substituto, antes de optarem por James Woods. Esta história revela muito sobre a cultura dos cameos, a pressa numa produção de grande sucesso, e os limites entre sátira e respeito por figuras públicas.
Resumo:
- Marlon Brando foi contratado para Scary Movie 2 para satirizar a cena do exorcismo de The Exorcist, com um pagamento de 2 milhões de dólares.
- Brando abandonou após um dia de filmagens devido a problemas de saúde, tendo estado em tratamento com oxigénio e com assistência para as falas.
- Os Wayans consideraram convidar o então recente ex-presidente Bill Clinton, mas optaram por James Woods para o papel final.
- A troca de actor e o contexto gerou debates sobre o impacto que um grande nome teria tido no tom do filme.
Porque é que Marlon Brando deixou Scary Movie 2?

Quando a equipa de Scary Movie 2 decidiu satirizar clássicos do terror, um dos alvos foi a icónica sequência de exorcismo de 1973, no filme The Exorcist. Os Wayans queriam elevar a aposta, e para isso trouxeram Marlon Brando para o papel do padre, intitulado Father McFeely, papel que em The Exorcist havia sido interpretado por Max von Sydow. O contrato de Brando, segundo relatos da imprensa da altura, incluía cerca de 2 milhões de dólares, um valor que sublinha a ambição do projecto em conseguir uma presença de peso.
No entanto, a saúde de Brando já não permitia o mesmo ritmo de trabalho, e a sua participação revelou-se problemática logo no primeiro dia. A actriz Natasha Lyonne, que parodiou Linda Blair na produção, recordou numa entrevista de 2022 que Brando filmou apenas um dia, aparecendo ligado a um cilindro de oxigénio, e com um auricular por onde um assistente lhe passava o texto, tal como relatado à Entertainment Weekly (EW). Depois desse arranque difícil, o actor decidiu retirar-se do projecto. Na altura, Marlon Wayans comentou ao New York Post, “We didn’t want to be the guys responsible for killing The Godfather”, reflectindo com humor e respeito sobre a impossibilidade de forçar Brando a trabalhar nas suas condições.
A saída de Brando obrigou a equipa a reagir rapidamente, numa produção com prazos e orçamento já definidos, e numa sequela que precisava de manter o impacto mediático do primeiro filme.
Foi mesmo considerado convidar Bill Clinton para o papel?

Uma das partes mais curiosas desta história é que os Wayans, na pressa por uma substituição que mantivesse o factor surpresa, chegaram a falar do nome de Bill Clinton. O ex-presidente dos Estados Unidos terminara o seu mandato em 2001, e vinha ainda marcado pela polémica do caso Monica Lewinsky. Segundo relatos ao New York Post, foi apenas um nome lançado para o ar, mais como um exercício de audácia criativa, do que um verdadeiro processo formal de casting.
Shawn Wayans explicou que, embora a ideia fosse tentadora, existiam questões de protocolo e de imagem, pois um ex-presidente tem compromissos e um estatuto público que o tornam inapto a aceitar todos os tipos de papéis, e algumas das cenas planeadas seriam demasiado explícitas para alguém que havia prestado juramento e representado uma nação. Em palavras do próprio, eles “tiveram de vir à razão, porque se trata do presidente, e há certas coisas que ele não pode fazer”.
A possibilidade, ainda que apenas especulativa, tornou-se notícia e alimentou a narrativa mediática em redor do filme, sublinhando a ideia de que Scary Movie 2 procurava constantemente o choque e a surpresa através de cameos inesperados.
Quem acabou por substituir Brando, e qual foi o impacto?
Com Brando fora do filme, a produção recorreu a James Woods para interpretar Father McFeely. Woods, actor experiente e conhecido por papéis intensos, aceitou o desafio de reinterpretar a figura parodiada. A sua prestação foi profissional e cumpriu a função cómica, mas muitos críticos e fãs consideraram que faltou o factor “choque” e a ironia metalinguística que uma presença do calibre de Brando, ou mesmo de Bill Clinton, teria trazido.
Imagens inéditas da transformação de Marlon Brando em “The Godfather”
Scary Movie 2 acabou por ser considerado, por intervenção da crítica e do público, um dos pontos mais fracos da série original, apesar de manter elementos de culto e momentos de humor que funcionam. O filme, realizado por Keenen Ivory Wayans, procurou misturar referências a vários filmes de terror, principalmente The Exorcist, mas também outros filmes e clichés do género. A substituição no casting foi um dos muitos factores que influenciaram a recepção do filme, não apenas pela mudança em si, mas pelo simbolismo de perder um nome lendário.
O que nos diz esta história sobre o fenómeno dos cameos em comédias?
A saga Brando-Clinton-Woods exemplifica como os cameos funcionam como ferramentas de marketing e surpresa em comédias, especialmente em filmes de paródia. Ao longo da história do cinema, personalidades de alto perfil a aparecerem em papéis autodepreciativos ou inesperados criam atenção mediática instantânea, e isso foi logo explorado pelos Wayans na série Scary Movie, que já tinha incluído participações como Queen Latifah, Charlie Sheen, Dr. Phil, e Shaquille O’Neal, entre outros.
Existe, no entanto, um equilíbrio delicado entre conseguir um nome por si só, e manter coerência artística e respeito pela figura em questão. No caso de Brando, a sua saúde e a necessidade de ser tratado com decoro falaram mais alto. No caso de Clinton, a barreira não foi apenas logística, mas também ética e política.
Os cameos podem acrescentar profundidade e surpresa, mas também podem ofuscar o filme, ou tornar a sátira demasiado dependente da presença de um rosto famoso. Scary Movie 2 serve como caso de estudo, mostrando que um cameo de peso pode alterar percepções e expectativas, e que a sua ausência também conta uma história.
E depois, o que aconteceu a Marlon Brando e ao papel de cameos políticos?
Após a sua curta experiência em Scary Movie 2, Marlon Brando fez ainda algumas aparições na tela, incluindo o filme The Score em 2001, e um vídeo musical com Michael Jackson para a canção “You Rock My World”, antes de falecer em 2004. A sua carreira permanece entre as mais influentes do cinema, com obras-primas como A Streetcar Named Desire, On the Waterfront, e The Godfather a assinalar um legado difícil de replicar.
Quanto à ideia de políticos a fazerem cameos, houve várias ocasiões em que figuras públicas americanas apareceram em séries e filmes, muitas vezes em papéis leves. Por exemplo, o Presidente Barack Obama teve pequenas participações em programas e eventos mediáticos, e outros líderes já participaram em sketches de humor controlados. Ainda assim, a participação de um ex-presidente em cenas potencialmente explícitas, como as planeadas para Scary Movie 2, continua a ser algo pouco provável, devido a questões de imagem, segurança, e repercussões políticas.
Conclusão
A história de Marlon Brando quase a aparecer em Scary Movie 2, e de Bill Clinton ter sido ponderado como substituto, é um excelente exemplo de como a indústria cinematográfica mistura criatividade, oportunismo e limites reais. Uma lenda do cinema saiu de cena por razões de saúde, e um ex-presidente foi apenas uma ideia audaciosa, ficando o papel nas mãos de James Woods. O resultado foi um filme que não deixou de entreter, mas que nunca teve o choque metalinguístico que uma participação de Brando poderia ter gerado.



