“Ad Astra” é um filme denso, curioso, que apresenta um vislumbre daquilo que hipoteticamente poderá ser o futuro. Uma autêntica metáfora da vida, das relações pessoais.
“Ad Astra” passa-se num futuro próximo, em que a criação de um projeto ambicioso na procura de vida inteligente no universo se torna perigoso para a humanidade. Depois de se saber que o criador desse mesmo projeto, Clifford McBride, pai da personagem central do filme, pode estar vivo e ser o responsável pelo planeta Terra estar a ser ameaçado, cabe a Roy McBride (Brad Pitt) tentar pôr fim àquela que é a mais arrojada, mas ao mesmo tempo também arriscada e penosa busca incessante.
Porém, isto é apenas o mote para o filme. “Ad Astra” não pode ser encarado apenas como um thriller de ficção científica. Encara-lo como tal é um erro crasso. “Ad Astra” é mais do que isso. É preciso acrescentar um tom dramático e uma história forte, onde as personagens são igualmente fortes e densas, com diversas camadas.
A dupla exploração do vazio… e do Universo.
“Ad Astra” é um filme muito pessoal, intimista. A par do que acontece com Roy McBride, o filme obriga quem vê a fazer um exercício de introspeção. O espaço surge como pano de fundo para a história que o filme apresenta. Porém não serve apenas como pano de fundo. É também uma metáfora. A exploração do vazio. Do vazio presente no espaço e na relação entre um pai e um filho. O foco é esse mesmo, o vazio criado por um pai ausente. Esse mesmo sentimento que se transpõe para sensação de vazio permanente sentida pela personagem de Brad Pitt.
A história é extremamente delicada e aqui entra a importância do desempenho de Brad Pitt. Todos os ingredientes teriam de ser adicionados de forma meticulosa e que em nada fossem excessivos, ora estaria a desafinar a sinfonia criada por James Gray. Existe o mérito do realizador e do ator ao preservarem o equilíbrio ao longo de todo o filme.
A criação de algo novo.
Um futuro próximo diferente do que se tem visto. Uma outra visão. Bastante arrojada em alguns pontos. Com cenários assombrosos, de uma realidade brutal, James Gray inova ao acrescentar aspetos no mínimo controversos. A presença e o crescimento da pirataria na Lua, onde esta era dividida em zonas seguras e perigosas. Um nascimento em Marte, que provoca o conflito. Um ser humano que passa a ser considerado um extraterrestre por ter nascido noutro planeta. Pode afirmar-se que é tudo muito superficial, contudo o intuito não era esse. Não era o explorar desses temas. Servem estes como tela onde é pintada a ideia essencial e aquela a que o filme, e o seu realizador, se propuseram tratar.
Os complementos do portentoso argumento.
“Ad Astra” tem como base o argumento, mas não se deixa ficar no que toca às interpretações e às partes técnicas. Repleto de momentos de tensão, com imagens de cortar a respiração, é de enaltecer o trabalho realizado por Hoyte Van Hoytema, o diretor de fotografia de filmes como “Deixa-me Entrar”, “Uma História de Amor”, “Interstellar” ou “Dunkirk”. Este trabalho teve um papel deveras importante no filme, o que acabou por influenciar e auxiliar a escolha dos planos por parte de Grey. Sempre muito seguro na realização, James Grey reúne uns quantos planos magistrais, que vão pontuando o filme de forma muito eficaz.
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Como marca importante, está também a definição da banda sonora e na forma como é usada. Em quase todos os momentos onde há máxima tensão, como confrontos ou até mesmo explosões, ao invés de a banda sonora acompanhar, com sons fortes, aparece o silêncio, ou então um som muito ténue, contrastando com a brutalidade visual.
Não é exigido muito de Brad Pitt a nível físico, mas sim a nível emocional. No passar para o lado de cá da tela os seus sentimentos e todas as emoções que vai sentindo ao longo do filme. Aqui volta a entrar a realização, com os sucessivos grandes planos dos olhos tristes e melancólicos de Roy McBride.
As influências e referências.
Para contar esta odisseia, James Gray (“Duplo Amor”) e Ethan Gross (“Fringe”), sustentam-se de outras mesmas odisseias como influências, porém com o devido distanciamento: “Apocalypse Now” com a jornada do exército norte americano na busca pelo coronel Walter E. Kurtze; Pelas adversidades encontradas no lado da não seguro da Lua a fazer lembrar “Mad Max: Estrada da Fúria”.
A impressionável palete de cores faz ainda lembrar “Blade Runner 2049”. Isto tudo tendo como base, como qualquer filme de ficção científica que se preze, “2001: Odisseia no Espaço”.
O falhar nos pormenores.
A introdução, que contempla o espaço até a premissa ser apresentada, pouco ou nada acrescenta. Breve, fugaz, o início do filme sabe a pouco. Apesar de cumprir e até conter uma cena forte, a sensação que fica é de efemeridade.
A voz off de Brad Pitt atrapalha em alguns momentos. Apesar de parecer simples de mais, não deve ser julgada como tal. A exteriorização dos pensamentos e sentimentos de Roy McBride ajuda a tonar o filme mais simples, o que, não sendo propriamente uma necessidade, acaba por ser mais fácil de ser acompanhado. O que, parecendo que agiliza, acaba por pecar.
Em suma, “Ad Astra” é um filme difícil de agradar a quem procura entretenimento. Concebido para fazer refletir e apresentar um ideai de futuro diferente do que se tem feito até então, “Ad Astra” é como uma melodia melancólica, em ritmo lento e em constante harmonia.