Deadpool 2 é exatamente aquilo que esperamos que seja: piadas vulgares sem fim juntamente com violência gráfica. É isto que é Deadpool, o personagem. É isto que é Deadpool, a marca. Foi por tudo isto que o primeiro filme foi um sucesso.
No entanto, por debaixo de todos os palavrões e referências a outros filmes de super-heróis, temos uma história real em que Deadpool (Ryan Reynolds) tem de aprender a lutar por alguém que não ele mesmo, assim como abrir o seu coração a outros. É uma história tão honesta como o resto do filme, apenas de forma diferente. No original o riso é histérico, constante e sem preocupações. Na sequela é-nos pedido que paremos um pouco e nos importemos com o arco emocional de Deadpool. No fim de contas, este sucessor é semelhante ao primeiro. Há uma nova carga emocional, mas a diversão é de tão alto nível se não maior que antes.
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Nesta história, Deadpool está numa viagem de auto-descoberta. Viagem essa que eventualmente o leva a juntar-se aos X-Men, numa missão que apenas causa problemas maiores e maiores, como um efeito “bola-de-neve” quando tenta ajudar um jovem mutante com os seus próprios problemas emocionais, Russell (Julian Dennison), que consegue criar fogo com as mãos. As coisas complicam ainda mais quando Cable (Josh Brolin), um viajante no tempo, aparece com a missão de matar Russsell. Determinado a proteger o jovem mutante, Deadpool cria a sua própria equipa. Apelida-a de X-Force. Faz parte da equipa Domino (Zazie Beetz), cujo super-poder é “sorte”, assim como outros membros com superpoderes. O objetivo é enfrentar Cable.
Tal como o primeiro, Deadpool 2 está carregado de humor referencial. Desta vez expande-o para filmes de superheróis incluindo Marvel e DC. De um certo ponto de vista, é um filme perfeito no seu humor e como o usa pois referência as conversas que milhões de fãs têm online enquanto discutem os seus filmes favoritos do género. É um filme que está completamente ciente das “modas” da cultura pop, e mergulha o suficiente para se tornar por vezes numa inteligente crítica sobre o assunto. Há piadas que iremos estar a repetir vezes sem conta, talvez até ao próximo filme de Deadpool. Mas por outro lado há piadas que o filme faz que certamente muitos já fizeram quando num convívio com amigos. O design de Deadpool não é ofender mas sim estar par-a-par com as piadas que amigos fazem uns com os outros num grupo fechado.
Onde podemos esperar que a sequela supere o original é nas sequências de acção, agora que o co-realizador de John Wick, David Leitch, entra em campo por detrás da câmara. Há pelo menos três sequências de ação memoráveis, todas elas práticas e em câmara, que deixam em nós o mesmo impacto que as sequências em outros filmes de Leitch nos deixaram. Dentro duma destas sequências encontramos uma pequena luta de efeitos, que não deixa de ser espetacular no seu próprio direito. Leitch (e Deadpool) conseguem tirar proveito disso, sabendo que se irá distinguir das outras. Leitch consegue demonstrar a sua mestria em capturar ação em câmara, num filme que está repleto da mesma mestria que vimos por dez minutos no seu filme anterior, Atomic Blonde.
No meio disto tudo, conseguimos momentos importantes para a história pessoal e o crescimento do personagem de Deadpool. Não irei revelar nada, mas enquanto que no primeiro conseguimos ter emoção dentro do mesmo tom, há momentos em que este filme tenta ser sério, mas no entanto o ritmo não abranda. Estamos constantemente a 100km à hora mesmo quando nos é pedido para respirarmos um pouco. É um pedido algo contrastante da parte dos argumentistas. Tanto o original como este conseguem dar emoção a uma comédia de ação, mas este cai no erro de mudar o tom sem nos deixar absorver e dar o tempo necessário a essas cenas para se desenvolverem.
Nada é sagrado no mundo de Deadpool, por isso como podemos abordar a história pessoal de Deadpool com o devido respeito? Isto é possível pois neste mundo o próprio filme que estamos a ver é vítima de piadas e de gozo. O mundo único de Deadpool e a sua marca de meta-humor permitem que haja um equilíbrio entra comédia e drama. Pois nenhum filme deve ser apenas dum ou doutro género.
Passando infelizmente aos pontos mais fracos do filme: embora os trailers sugiram o contrário, este é mesmo um filme de Deadpool (ft. X-Force). Personagens como Domino e Cable são os únicos que nos deixam impressionados para além do protagonista. Sim, é incrível ver personagens favoritos dos fãs pertencentes à equipa X-Force, como por exemplo Shatterstar, mas tudo o que eles oferecem aos filme é uma oportunidade para gozar com eles. Deadpool, Cable e Russell são os únicos a ter um arco no filme, e Russell apenas tem um arco pois é vital para o desenvolvimento de Deadpool. Domino é uma personagem interessante, tanto narrativa como cinematicamente, mas não é particularmente memorável. Tem uma grave falta de qualquer motivação durante o filme. Talvez num futuro filme de X-Force nos mostre que tem mais para dar.
Se precisam de provas de como Deadpool 2 expande o seu próprio género: NÃO SAIAM DA SALA SEM VER AS CENAS PÓS-CRÉDITOS! Cheias de referências de genuíno impacto, que talvez mude o filme que acabamos de ver, assim como o universo no qual este mesmo se encontra.
O filme em si está fora de controlo no que toca a cameos, referências a aparições anteriores do personagem, e não é apenas uma sucata para piadas velhas ou para sugerir o que está por vir. É igualmente uma pura carga de adrenalina que muitos outros filmes não conseguiriam conter.
Apesar destes obstáculos, Deadpool 2 é um filme incrivelmente agradável. São duas horas de puro riso. Tanto à custa do ator principal, como do próprio filme e das pessoas envolvidas no mesmo. Os fãs do original e de filmes do género vão adorar e entender tantas mais coisas que outros não irão. Deadpool 2 é um filme que sabe tudo que está a fazer, e com isso surpreende-nos com reviravoltas e surpresas ao longo da narrativa, e ficamos com belas memórias tal como ficamos com o original. O riso é tanto do início ao fim, que não conseguimos escolher uma piada favorita. Numa comédia, isso tem de ser bom. Deadpool 2 faz-nos lembrar um sketch de Looney Tunes cheio de violência. Desafia convenções estabelecidas pelo original, e quando não achamos que algo tem piada, assegura-nos que fomos nós a vítima.