Para a sua nova comédia, Will Ferrell convida Rachel McAdams e ambos embarcam numa viagem musical em formato de homenagem à Eurovisão.
Will Ferrell já muitas vezes confessou que é um aficionado da Eurovisão desde pequeno. Já muitas vezes acompanhou de perto o concurso, viajando às cidades hospedeiras do festival para assistir ao espetáculo na primeira fila (inclusive em Portugal).
Portanto, dizer que ele sempre teve o bichinho de fazer um filme em homenagem ao festival não é de todo estranho. Assim, com a ajuda de David Dobkin (“Os Fura-Casamentos”), oferece-nos este “Festival Eurovisão da Canção: A História dos Fire Saga” – sim, este é o título do filme e, por ser ridiculamente extenso, irei apenas referir-me ao filme por “Eurovisão: Fire Saga”.
Neste filme, distribuído pela Netflix, seguimos a história de Lars (Will Ferrell) e Sigrit (Rachel McAdams), dois jovens oriundos da Islândia com uma paixão por música e o sonho de participar na Eurovisão. Por mero acaso, essa oportunidade caí-lhes no colo e eles terão de mostrar ao Mundo aquilo que a Islândia é capaz, apesar de vir a ser um caminho mais turbulento do que seria esperado.
É seguro dizer que Will Ferrell é brilhante no registo de comédia. Já nos ofereceu filmes incríveis personificando papéis icónicos e que se entranharam no zeitgeist cultural. Porém, nos últimos anos tem tido grande dificuldade em recuperar a magia a que estávamos habituados vê-lo.
“Eurovisão: Fire Saga” é o mais perto que conseguimos ter de ver esta magia vinda de Ferrell nos últimos 10 anos. Contudo, mesmo estando tão perto, nunca chega a atingir um patamar de sucesso.
Não é culpa de Ferrell que este filme não chegue ao seu potencial. Aliás, não é culpa de ninguém do elenco. Todos oferecem o melhor que conseguirem para os papéis mínimos que têm. Rachel McAdams nunca deixa de espalhar beleza e talento, com uma óptima dinâmica para com Ferrell. Tal como Dan Stevens e Pierce Brosnan, ninguém se fica por metade.
Também não é na parte da produção que o filme resvala. Seja nas paisagens frias da Islândia ou na recriação perfeita dos momentos do Festival da Eurovisão, tudo tem uma magnitude e poder apropriadas, deixando de ser apenas um plano de fundo e passando a ser uma personagem essencial para o filme.
Onde “Eurovisão: Fire Saga” não consegue atingir o potencial é pelo seu argumento e, por consequência, o facto de nunca chegar a unir-se a um único tom.
O filme anda num limbo entre a carta emotiva e nostálgica ao Festival da Eurovisão e o puro filme de comédia, com situações caricatas e cenários impossíveis de resultarem num mundo real. Por isto, “Eurovisão: Fire Saga” mistura o ridículo com o realista, nunca chegando a abraçar por completo nenhuma destas vias.
Os momentos de comédia são fracos e, muitas das vezes, a roçar uma infantilidade pouco recomendável, o que remove todo o impacto emotivo e com alguma alma da história a ser contada. De modo a resultar, ou focavam-se em contar uma história perto do realismo da Eurovisão, com toques pontuados e bem-vindos de comédia, ou viravam o bico ao prego e faziam um filme de comédia com tom de paródia, mas com um forte coração a bombear no meio da balbúrdia.
Sem nunca se decidir, “Eurovisão: Fire Saga” não é nem carne nem peixe. É um híbrido dos dois mundos, numa misturada demasiado extensa e com pouco a acompanhar que lhe dê sequer um estatuto de memorável.
Até mesmo o jogo de descobrir todos os cameos de figuras ligadas à Eurovisão perde todo o quando o argumento decide colocar um song-along no meio do filme, cortando a narrativa para fazer um videoclip totalmente descabido com vários ex-participantes do festival a cantar músicas pop de Cher e Black Eyed Peas.
Apenas o cameo do nosso Salvador Sobral é que é feito de uma forma orgânica e, de certo modo, poético, depositando em mim algum orgulho nacional enquanto via o filme.
No fim, “Eurovisão: Fire Saga” poderia ser algo que nunca chega a ser. Apesar de ser um projecto de paixão de Will Ferrell, o filme nunca chega a atingir as notas altas necessárias para poder encantar o seu público.