Atualmente, é verdade que, em termos de argumento, filmes de super-heróis tendem a ser cada vez mais escassos. São cada vez menores as maneiras de se contarem as histórias de origem.
“Homem de Ferro”, juntamente com “Homem-Aranha” e “Batman – O Início”, apresenta a fórmula mais básica de introduzir um novo personagem. A descoberta de poderes, o progresso moral e psicológico e o inevitável confronto com o antagonista, que sai sempre derrotado. No entanto, quererá isto tudo dizer que a fórmula de “Homem de Ferro” não funciona? Não, aliás, muito pelo contrário. A fórmula (mesmo repetitiva) resulta ainda nestes dias, em filmes como “Homem-Formiga” e “Doutor Estranho”, e tendo em conta que “Homem de Ferro” permitiu a origem de todos estes novos personagens na grande tela, não se poderá dizer que, em 2018, a fórmula se terá tornado ineficiente.
Em Portugal, “Homem de Ferro” foi lançado no dia 1 de maio de 2008. Foi realizado pelo americano Jon Favreau, responsável pelos ótimos “Chef”, bem como pela versão live-action de “O Livro da Selva”. O argumento é da autoria de Art Marcum, Matt Holloway, Mark Fergus e Hawk Ostby. O próprio Kevin Feige, CEO da Marvel Studios, esteve envolvido na produção. Pois quem mais?
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O Jon Favreau, para além de uma boa participação como Happy Hogan, o guarda-costas de Tony Stark, tem um ótimo olho para a ação. Toda ela auxiliada por uma emocionante banda sonora, uma fotografia limpa, atenta e brilhante, assim como um bom uso de efeitos práticos, sem o exagero atual de efeitos visuais. Esta é assente em ótimas sequências de combate mano a mano, cenas de perseguição aéreas, cenas explosivas em terra, bem como uma eficiente representação da opressão afegã inicial que aprisiona Stark.
O terrorismo, mesmo subutilizado nos filmes seguintes da trilogia, serviu (e servirá sempre) como um catalisador das questões geopolíticas mais importantes em qualquer obra do género. Isto é, terrorismo existe no nosso mundo e é um elemento antagónico perfeito no que diz respeito ao comentário de “Homem de Ferro” acerca da liberalização de armamento e de inovações tecnológicas. Assim como, aliás, das forçadas propagandas de guerra que tanto querem convencer a população americana de um falso patriotismo.
O personagem do Jeff Bridges, o magnata de armas sedento por poder, Obadiah Stane, seria considerado genérico, caso apresentado hoje. Uma vez que surgiu primeiro e que as suas motivações são bem claras, devemos dar crédito ao ator pelo seu excelente trabalho (como de costume). O personagem é venenoso, manipulador, hipócrita, detestável e representa um lado nocivo do capitalismo.
Eu construí esta empresa do nada! E nada se irá meter no meu caminho.
Que irónico, Tony. Ao tentar livrar o Mundo das armas, deste-lhe a melhor de todas. E agora, vou te matar com ela.
No lado oposto temos Tony Stark, um egocêntrico, narcisista, arrogante, sexista, porém extremamente carismático, talentoso e inteligente engenheiro/criador à frente da maior empresa de armas do Mundo. O arco do mesmo funciona esplendorosamente bem devido às experiências pelas quais passa num dos ambientes mais hostis e selvagens. Ao ficar ciente dos danos colaterais do seu enriquecimento, decide usar o seu conhecimento, riqueza e coragem para o bem. Constrói, assim, uma arma pessoal estupidamente avançada e age como um vigilante. Posteriormente, aprende lições valiosas sobre amizade, dever e amor. Dentro de tudo isto, está a sensacional interpretação de Robert Downey Jr., cujo regresso a Hollywood, depois de “Kiss Kiss Bang Bang”, não podia ser mais glamoroso. É esta a definição de “casting perfeito”. Robert Downey Jr. é Tony Stark. Não é possível separar as duas personalidades.
Eu sou o Homem de Ferro.
O caso do Terrence Howard é uma pena. Se a situação com o Robert Downey Jr. e a Marvel Studios tivesse sido resolvida, poderíamos hoje ter um Coronel James Rhodes bem diferente (quem sabe melhor que o do Don Cheadle) e a carreira do Terrence podia estar atualmente no auge. No entanto, durante o tempo que teve, este tem uma boa química com Downey e, de facto, deu vontade de o ver na pele do Patriota de Ferro/Máquina de Guerra.
De resto, o Clark Gregg e o Samuel L. Jackson têm bons papéis, que serviram para satisfazer os fãs sedentos por um filme com os Vingadores. O Paul Bettany é cativante na pele (ou voz) do JARVIS. O Shaun Toub consegue construir o seu personagem perfeitamente com muito pouco tempo em cena. Porém, eu preferia que o careca afegão fosse excluído e que o seu lugar fosse tomado pelo gordo barbudo, que sempre tem mais personalidade e uma presença diferenciada da de um típico terrorista mauzão. Em vez de serem dois personagens, bastava que, com alguns ajustes no argumento, fosse apenas um.
E, já que estamos a falar de contras, aproveito para dizer que acho a Gwyneth Paltrow uma péssima atriz e que o papel da Pepper Potts não podia ter sido pior aproveitado. O que a salva (minimamente) é a química com o Robert Downey Jr.. Simultânea e ironicamente, contracenar com qualquer ator é o que realça o quão inexpressiva, aborrecida e desinteressante é como atriz. Mesmo a personagem tendo sido bem escrita, não há qualquer carisma na execução.