Aquele que aparenta ser o último filme de Daniel Day-Lewis apresenta-nos uma história única sobre amor e crueldade. Linha Fantasma certamente apresenta-nos a duras realidades das relações humanas.
Linha Fantasma, de Paul Thomas Anderson, conta a história do renomeado costureiro Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis). Um dos grandes nomes da moda Britânica dos anos 50, vestindo várias mulheres da alta sociedade. A vida amorosa de Reynolds irá dar uma reviravolta quando conhece Alma (Vicky Krieps), uma jovem perseverante que se torna na sua musa e amante.
Sem dúvida que um dos maiores elogios que devo a este filme é ao seu guarda-roupa, cinematografia e banda-sonora. “Elegância” é a palavra certa para definir o tom e cenários do filme. Não o digo apenas por a ação se passar num meio dominado por elites sociais. Todos os planos, elementos visuais e música fluem de forma bastante “smooth” o que torna o filme numa experiência agradável embora isso também traga uma desvantagem que irei abordar mais adiante.
Um dos destaques do filme sem dúvida é a personagem de Daniel Day-Lewis, baseada nos estilistas Charles James e Cristóbal Balenciaga. O homem claramente é exigente e perfeccionista no que faz. O seu feitio peculiar não só lhe dá uma certa humanidade, como o distingue das outras personagens. Só a sua irmã Cyril, interpretada por Lesley Manville, consegue ter uma certa mão em cima dele. Mas falarei dela e das restantes personagens mais adiante.
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Alma, por sua vez, não é aquilo que poderá parecer ao início. Tanto ela como as outras mulheres do filme representam bem a forma de estar geral das mulheres naquela época. Alguns poderão achá-la uma mulher “fraca” por teimar em permanecer numa relação disfuncional, mas no fim a sua preserverança, paciência e, de certa forma, uma teimosia mórbida acabam sempre por fazer com que Reynolds sinta que precisa dela na sua vida.
A maioria das restantes personagens são mulheres. Conforme referi no caso de Alma, nota-se que as personagens se comportam de forma bastante similar às mulheres dessa época. No entanto, desengane-se quem pensa que isso lhes dá automaticamente uma “fraqueza” em relação aos personagens masculinos. São mulheres que se limitam a fazer o que têm que fazer, mas isso não significa “calar e consentir”. Alma e Cyril são os maiores exemplos disso, sendo a segunda uma líder quando o tem que ser e uma das únicas que faz frente às “pancas” do seu irmão, ao mesmo tempo sendo aquela que o conhece melhor do que ninguém.
Aqui aproveito para salientar um dos maiores “pecados” no filme que poderá ser motivo de irritação da parte de alguns expectadores: a ação prolonga-se por um tempo desnecessário em certas partes. Alguns momentos parados e outros um pouco “creepy” poderiam ser removidos que a história não iria sofrer em demasia. Este defeito pode ser um pouco atenuado pela tal fluidez dos aspetos visuais e sonoros do filme que referi anteriormente. No entanto, estaria a mentir se dissesse que 130 minutos é pouco para o tipo de filme em causa.
Contudo, no geral Linha Fantasma acaba por ser uma experiência cinematográfica que compensa. Poderá não ser um filme que caia bem à audiência geral, mas as suas qualidades são facilmente identificáveis e valorizáveis. O facto de ter tornado uma relação que na vida real seria considerada disfuncional e tóxica num dos elementos que domina e mantém o interesse na ação do filme é algo que é louvável.
Se este é ou não o último papel de Daniel Day-Lewis nos grandes ecrãs ainda não se sabe com certeza. Mas caso o seja, sem dúvida que o ator mostrou que o seu talento irá deixar saudades. É o tipo de filme que permite mostrar os defeitos humanos que normalmente não são fáceis ou agradáveis de abordar. Como a própria Alma refere no início: “O que quer que faças… Fá-lo com cuidado.”