A produtora Lifetime resolveu elevar a televisão a um novo patamar. Criar uma série de ficção que incide sobre os bastidores de um reality show (muito semelhante aos que fazem parte de quase todo o horário nobre da MTV) e dissecar todo o ambiente intriguista e malicioso que os produtores exigem para terem audiências astronómicas. Nem precisamos de ir tão longe no zapping até à MTV para tentarmos entender a mensagem de UnREAL, tenham o exemplo de A Casa dos Segredos, o primo nacional desses programas.
Rachel (um papel incrível de Shiri Appleby) é uma dedicada produtora do programa “Everlasting” e foi recentemente recontratada para acompanhar as meninas que se inscreveram no show. Rachel tem historial de desequilíbrios psicológicos e de se envolver emocionalmente com intervenientes do seu local de trabalho, mas é boa no que faz; é uma produtora que vai até ao limite dos seus valores ao tentar manipular as situações a favor do programa para que os seus superiores tenham drama fácil e chocante que é essencial para obter maiores e melhores resultados. “Everlasting”, liderado pelos produtores executivos Chet e Quinn (Craig Bierko e uma impiedosa Constance Zimmer), é um reality show que consiste num conto-de-fadas em que o príncipe Adam Cromwell (protagonizado por Freddie Stroma), endinheirado membro da alta sociedade britânica, terá que selecionar por etapas aquelas que serão as potenciais donas do seu coração até chegar à “dita cuja”. As meninas, em geral, são todas de corpos delineados, com sorrisos encantadores e poucos neurónios a funcionar mas rapidamente entendem que para conquistar o coração de Adam terão que competir furiosamente umas com as outras. A ambiguidade moralista com que Rachel se debate no dia-a-dia e na pressão que exigem sobre ela leva-nos pelos horrores do que é trabalhar num local em que facadas psicológicas são dadas a qualquer minuto e a forma como nós, enquanto seres humanos, necessitamos de nos ver a maltratar uns aos outros para nosso próprio entretenimento.
Numa análise geral, UnREAL marca pela ousadia com que retrata um universo incógnito que transcende as necessidades do público a que se dirige, não mostrando qualquer piedade para com os intervenientes de um reality show e explora as características morais que compõem os criadores destes mesmos programas. As prestações são magníficas, com destaque para Shiri Appleby e Constance Zimmer que é uma versão feminina de Frank Underwood num meio mais pequeno (note-se que a atriz também participou em House of Cards). O argumento é frenético e polvilhado de intrigas que apelam à nossa veia mesquinha e que nos deixa em pulgas para o episódio que se segue. Apesar de perder um pouco o carisma nos episódios finais, UnREAL é uma obra interessante de televisão que nos deixa em conflito com a nossa conduta e valores pessoais e, acima de tudo, usa e manipula convenientemente uma realidade mascarada. Nem tudo o que vemos na televisão é cor-de-rosa e bonito e satiriza levemente a necessidade humana de querer entretenimento fácil e oco.