J’accuse – O Oficial e o Espião | A verdadeira justiça, segundo Polanski

Nomeado a 12 prémios César, "J'accuse - O Oficial e o Espião" caminha entre a espionagem e o retrato histórico. O melhor filme de Roman Polanski desde "O Pianista".
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Nomeado a 12 prémios César, “J’accuse – O Oficial e o Espião” caminha entre a espionagem e o retrato histórico. O melhor filme de Roman Polanski desde “O Pianista”.

O caso de Alfred Dreyfus sempre foi uma nódoa na reputação do exército francês. Condenado injustamente em 1894 pelo crime de alta traição e exilado para a Ilha do Diabo à costa da Guiana Francesa, Alfred Dreyfus foi rapidamente considerado culpado por ser, de entre os poucos suspeitos que nem chegaram a ser investigados, o único judeu no Estado-Maior.

A história deu origem a múltiplas adaptações ao cinema, a primeira, a curta-metragem de 1899 “L’affaire Dreyfus” de George Meliès, foi banida em França por causar distúrbios entre defensores e detratores de Dreyfus. Quase 60 anos depois, José Ferrer (oscarizado por “Cyrano de Bergerac”) realizou e protagonizou “O Julgamento do Capitão Dreyfus”. Mais recentemente, em 1991, Richard Dreyfuss (que em jovem pensava ser familiar de Alfred) interpretou o acusado no telefilme “Prisioneiro de Honra” de Ken Russell (nomeado aos Óscares por “Mulheres Apaixonadas”).

 

Agora no séc. XXI, Roman Polanski apresenta a sua versão dos factos com um sublime “J’accuse: O Oficial e o Espião”, que caminha entre o filme de espionagem à Alfred Hitchcock e o filme histórico puro e duro. Muito bem enquadrado desde a sequência inicial da humilhante destituição do cargo, ao ar livre, frente ao exército e perante uma multidão raivosa, ao plano final que encerra um capítulo na vida das duas personagens principais, realização e direção de fotografia apresentam um trabalho clássico mas de execução irrepreensível. Muito bem acompanhados de uma excelente direção artística que nos faz sentir os décors habitados pelas personagens e de uma banda-sonora de Alexandre Desplat (num intervalo de produções norte-americanas) que marca o tom pretendido por Polanski.

Jean Dujardin é o protagonista no papel do Coronel Georges Picquart, uma vez que após o exílio de Dreyfus, é a vida do coronel e a sua luta por justiça que vamos acompanhar até ao fim do filme. Destacado para a secção dos serviços secretos após a aposentação do Coronel Sandherr, Picquart depara-se com um ambiente suspeito nas instalações militares e começa a desconfiar que ajudou a colocar na prisão o homem errado.

No entanto, o exército não quer um outro escândalo e tudo fará para parar uma nova investigação, mesmo que para isso o verdadeiro espião, que continua a fornecer informações confidenciais ao exército alemão, não seja condenado e um inocente fique em prisão perpétua numa ilha deserta.

Dujardin (“O Artista”) tem um desempenho firme e subtil de um antissemita a tentar obter justiça por um judeu, afirmando-se como um dos grandes atores da atualidade do cinema francês e certamente merecendo a nomeação ao César de Melhor Ator. Louis Garrel (“Mulherzinhas”), embora num papel mais secundário várias vezes relegado a flashbacks, transmite a dor e o sentimento de injustiça presentes em Dreyfus.

Grégory Gadebois (“Marvin”), menos conhecido dos portugueses, também merece ser destacado como Tenente-Coronel Henry, um dos responsáveis pela rápida acusação de Dreyfus, movendo-se por detrás dos grandes nomes do exército e do governo francês. Emmanuelle Seigner, Mathieu Amalric, Melvil Poupaud, Vincent Perez, Denis Podalydès e Laurent Stocker são alguns dos nomes que completam o elenco secundário.

O argumento, baseado na obra de Robert Harris, e adaptado pelo próprio numa colaboração com Polanski é um dos pontos mais fortes do filme, pois em momento algum a história perde intensidade. Muito pelo contrário, os paralelismos com a corrupção na atualidade, quer no exército como no governo e nos tribunais e os problemas socio-culturais só mostram que por mais séculos que passem a humanidade continua igual a si mesma.

“J’accuse: O Oficial e o Espião” é sem dúvida o melhor filme de Roman Polanski desde que “O Pianista” lhe valeu um Óscar de Melhor Realização e merece cada uma das 12 nomeações aos prémios César da Academia Francesa de Cinema e o Leão de Prata do Grande Prémio do Júri do Festival de Veneza.

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