Podia ser melhor, mas também não é o filme desastroso que muitos anunciaram. “The Nun – A Freira Maldita” arriscou na mistura entre humor e terror.
Visto por mais de 150 mil espectadores entre 6 e 12 de Setembro, “The Nun – A Freira Maldita” bateu o recorde de melhor semana de estreia de sempre para um filme de terror em Portugal. Nos EUA, os 53,8M$ que arrecadou, embora sejam menos de metade da estreia de “IT” (o atual recordista da categoria com 123M$), são suficientes para bater o recorde do Conjuring Universe. Ultrapassa assim os 41,8M$ do primeiro filme “The Conjuring – A Evocação” e diga-se de passagem o melhor de todos eles.
Mas não é de quantias monetárias que a qualidade de um filme é medida. E no caso de “The Nun”, o lado crítico é o total oposto de um êxito. No Rotten Tomatoes tem uns miseráveis 27%, no IMDb está nos 5,8/10 e muitos críticos portugueses correram-no a 1 Estrela. Tal levou-me a refletir um pouco mais sobre o que escrever. E, daí, esta crítica sair com mais de uma semana de atraso em relação à estreia do filme. Isto porque não querendo simplesmente ser do contra, a verdade é que gostei do filme e há que admiti-lo.
“The Nun” não é uma obra-prima, desperdiça o potencial da ideia central e tem um final da treta, claramente para justificar (“às três pancadas”) a existência do filme no Conjuring Universe. Mas como puro cinema de entretenimento resulta. É um bom filme para ver com os amigos numa ida ao cinema. Mas o objetivo é descontrair, divertir e apanhar alguns sustos.
Um dos aspetos mais interessantes é o género em que o filme aposta. Ao contrário de um ambiente pesado e estilizado de terror gótico e religioso que muitas pessoas poderiam aguardar, ou de inúmeros jump-scares sucessivos e inesperados como queria vender a campanha de marketing, “The Nun” toma uma abordagem completamente diferente e aposta no humor. Ou seja, o filme doseia em igual medida humor e terror. Isto causou grande espanto de muitos dos que assistiram ao filme nestes poucos dias desde a sua estreia. Esta surpresa inclui pérolas cheesy como “I’m not french. I’m french canadian.” (ao invés de um qualquer outro diálogo magnânimo no confronto final com Valak) e ainda um “Holy Shit!” do camponês a que o padre responde “The Holiest!”.
A visita de uma noviça de Londres e de um padre do Vaticano a um convento na Roménia nos anos ‘50 após o suicídio de uma freira, tem todo o potencial para dar origem a uma obra-prima do cinema de terror. Mas quando a ameaça, por imposição de outro filme do franchise, é uma freira demoníaca sobrenatural, a decisão de não levar o filme tão a sério é claramente a mais acertada. E daí, na minha opinião, este tipo de humor acaba por encaixar muito bem na estrutura do filme.
Outro ponto forte é o trio de protagonistas. Este é composto por Taissa Farmiga (irmã na vida real de Vera Farmiga, protagonista de “The Conjuring”), Demián Bichir (nomeado ao Óscar de Melhor Ator por “A Better Life”) e Jonas Bloquet (que recentemente participou em “Ela”, de Paul Verhoeven). Quando os três estão juntos no ecrã, a interação e as trocas de diálogo resultam muito melhor na dinâmica do filme do que quando partem por caminhos separados. Taissa consegue refletir um lado de pureza, inocência e bravura; Demián, o ator mais velho do grupo, transmite segurança e sapiência; e Jonas incute o humor de forma muito natural na sua personagem.
Quanto ao terror, e porque afinal de contas isto é suposto ser um filme de terror, “The Nun” tem muitas cenas no escuro (algumas mais escuras do que deviam) onde um jump-scare pode surgir a qualquer momento. E embora sejam poucos os sustos inteligentemente elaborados, não nos podemos queixar da falta de momentos de grande tensão. Um outro elemento bem explorado diz respeito às outras freiras do convento, embora não queira aprofundar para não revelar spoilers. O elemento mais fraco acaba assim por ser a justificação forçada para Valak ainda estar presente tantos anos depois em “The Conjuring 2”, uma vez que já nesse filme Valak era um dos pontos que mais destoava.
A realização de Corin Hardy acaba por ser competente para o tipo de filme que é. As maiores falhas encontram-se claramente no argumento de Gary Dauberman. Ele foi o argumentista dos outros dois spin-offs “Annabelle” e “Annabelle: A Criação do Mal”. “The Nun – A Freira Maldita” é assim um filme que compreensivelmente desiludiu muitas pessoas pelo verdadeiro potencial desperdiçado, mas que apesar de tudo deve ser apreciado de forma descontraída pelo produto de divertimento que o estúdio pretendia vender às massas e que eficazmente conseguiu produzir.