A Balada de Adam Henry – riqueza visual, potencial narrativo decadente

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Já percebi que ainda vou ter de esperar pelos grandes e sérios candidatos aos Óscares. Mas bem que este certamente poderia ser um deles.

Baseado no romance homónimo do próprio guionista inglês Ian McEwan, publicado em 2014, o filme acompanha Fiona Maye, uma juíza inglesa que deve controlar o desmoronamento do seu casamento enquanto lida com o recente caso de um adolescente com leucemia, e respetivos pais que recusam a transfusão de sangue necessária devido a princípios religiosos.

O filme foi realizado pelo (também) inglês Richard Eyre, responsável por “Iris”, de 2001, e pelo recente “King Lear”, da Amazon. Curiosamente, os trabalhos de Ian McEwan (responsável igualmente pelo recente “Na Praia de Chesil”, com a Saiorse Ronan) são quase todos consequentes adaptações das suas próprias obras literárias. Posto isto, há que admitir que talvez este devesse pensar em adaptar outro material qualquer futuramente.

A Balada de Adam Henry

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“A Balada de Adam Henry” não é um mau filme. É, na verdade, somente um exemplo perfeito de um que particularmente, se perde a partir da metade do segundo ato, devido a escolhas incompreensivelmente incorretas. Por outro lado, há diverso talento em toda a oferta cinematográfica, nomeadamente na execução do texto, na estética e nos restantes aspetos técnicos.

A começar pela fotografia de Andrew Dunn, conhecido por “As Vantagens de Ser Invisível”, outro filme distinto pelo seu visual. Guardadas as devidas proporções, “A Balada de Adam Henry” lembra ligeiramente “Linha Fantasma”. O design de produção e o guarda-roupa são belíssimas virtudes – visualmente limpas, brilhantes e confortáveis. A câmara movimenta-se pela casa da protagonista e lentamente ficamos com a sensação de que a conhecemos, devido à sua modesta dimensão e simplicidade dentro da quase detalhadamente obsessiva organização. Principalmente nestes cenários, o realizador ostenta os seus melhores planos. Entre eles, alguns bem abertos na sala principal, cortando para alguns mais simétricos ou dispersos, tendo em conta o estado de espírito dos personagens.

A Balada de Adam Henry

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Quando o filme sai da casa principal, entra nos corredores do tribunal. A estética mantém-se de maneira menos acentuada, mas igualmente agradável. Pode-se dizer o mesmo acerca das ruas londrinas e até do hospital. Também fotografando as salas de audiência de modo esplendoroso e imponente. Tudo isto, claro, sem aquela palheta mais sombria do Paul Thomas Anderson. Não dá para falar em cópia, também devido à estreia do filme no Festival de Toronto do ano passado.

E para um filme tão elegante como este, uma boa banda sonora é sempre um bom. Na verdade, esta não diverge muito de longas composições de piano, oscilantes entre momentos pesados, melancólicos e enternecedores. Esta é da autoria do inglês Stephen Warbeck, o compositor de “Billy Elliot”.

A Balada de Adam Henry

O filme é também elevado graças às ótimas interpretações. A Emma Thompson desenvolve uma personagem em conflito e dúvida de modo não muito diferente ao que fez no passado. Todavia, consegue criar uma mulher distinta das restantes da sua filmografia, mantendo o público cativado graças ao seu carisma e postura solidamente autoritária. Pelo menos enquanto membro superior da justiça, carregando o peso das suas declarações. A personagem tem, como é óbvio, o seu lado mais pessoal, que está constantemente com a cabeça a fervilhar devido ao stress profissional diário e aos recentes desentendimentos de peso com o marido.

Falando nele, o Stanley Tucci (para surpresa de ninguém) encontra-se novamente em grande forma. Difícil será encontrar o filme em que o americano não esteja bem. No entanto, ao contrário dos restantes da sua carreira, o  seu personagem desta vez consegue ser odiável. Este começa com um discurso totalmente compreensível, adotando posteriormente uma série de comportamentos puníveis e moralmente errados que revelam o quão pouco sabíamos sobre o mesmo. No entanto, não é difícil sentirmos uma certa empatia por ele. Somando às performances, tendo em conta todos os fortes choques e comentários trocados entre ambos, a química entre os dois atores é ótima. As cenas da dupla são as que deixam mais anseio e expetativa.

A Balada de Adam Henry

O Jason Watkins tem um lado adoravelmente trapalhão e tímido. O personagem aparece quando necessário e gera risos fáceis, fornecendo um ótimo (e bem aplicado) alívio cómico. No entanto, não se pode falar virtuosamente do Ben Chaplin ou da Ellen Walsh. A dupla é completamente desperdiçada. Na verdade, não conheço os atores, mas nem lhes é dada uma oportunidade de aprofundar os personagens, deixando-os menos unidimensionais e à mercê de um argumento expositivo.

O estreante Fionn Whitehead claramente esforça-se bastante e o respetivo personagem é o mais interessante do filme. É muito fácil que o soldado principal de “Dunkirk” venha a ter sucesso no cinema futuramente. O Adam Henry é profundamente complexo moral e intelectualmente, revelando-se um jovem talentoso, culto e ambicioso. As cenas que partilha com a Emma Thompson são inicialmente as mais interessantes. Todavia, tanto o ator como as respetivas cenas sofrem de um grave problema – o argumento.

A Balada de Adam Henry

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Como já disse, o Ian McEwan bem que se podia dedicar ao guionismo de outra maneira. O livro com certeza tem qualidade. Pelos menos, as avaliações online disponíveis deram-me esta impressão. Para começar, o filme consegue fazer bons comentários acerca de casamento, infidelidade, dependência, justiça, moral, bem como um pouco de fanatismo religioso. O que acontece é que, para além de pequenas sub-tramas e cenas espontâneas absolutamente inúteis, o filme decide ocupar o seu tempo de outras maneiras. Com tamanha temática, dava para se fazer algo extraordinário, mas “A Balada de Adam Henry” peca a partir do final do segundo ato, começando a tomar outros caminhos narrativos, nomeadamente o melodrama e a filosofia barata. A expressão “encher chouriços” nunca foi tão apropriada.

De seguida, o filme começa a parecer involuntariamente um stalker movie genérico. Bem que podia ser tudo feito de outra maneira, mas devido ao desleixo do argumento a meio do caminho, foi difícil acompanhar a trama com um investimento idêntico ao inicial, como era pretendido. Se no começo, estava perfeitamente investido nos personagens e à espera de um bom filme, lentamente observei as performances (ainda que ótimas) a serem prejudicadas, acabando numa conotação afetada e negativa.

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