Muito conhecida dos portugueses por novelas como “Ouro Verde” e “A Única Mulher”, Joana de Verona fala ao Cinema Pla’net sobre os seus projetos mais recentes no cinema.
Num ano em que participa em três filmes que estrearam nas salas de cinema portuguesas (“Pedro e Inês”, “Praça Paris” e “Amor, Amor”), Joana de Verona cuja carreira passou por filmes como “Mistérios de Lisboa”, “As Mil e uma Noites” e “Como Desenhar um Círculo Perfeito” fala sobre o Brasil, Inês de Castro e os desafios de conjugar as filmagens das telenovelas com outros projetos.
“Praça Paris” (de Lúcia Murat) é um filme muito relevante para o Brasil da atualidade…
Foi bastante exigente. É um filme muito pertinente que acho que as pessoas têm de ver. A Lúcia Murat é uma mulher que tem uma filmografia crítica incrível. É uma resistente de esquerda numa época em que se lutou contra uma ditadura militar. É uma mulher que foi torturada, exilada política, portanto ela tem imensa capacidade para falar de sistemas de poder, sobre violência e neste filme ela fala através da minha personagem que é a Camila.
https://www.youtube.com/watch?v=SaXWZDDhAWg
A Camila é a representação de uma mulher de classe média branca europeia, a presença da colonização num Brasil em que há uma psicóloga e uma paciente que é a Grace Passô, dentro do enquadramento social de ser uma mulher negra, desfavorecida do ponto de vista social, moradora numa favela e irmã de um traficante.
Logo, em termos dos arquétipos da personagem, são completamente opostas, o que nos leva a refletir como é que cada uma existe e se relaciona num Brasil socialmente e politicamente conturbado. É um filme imperdível desse ponto de vista principalmente tendo em conta tudo o que está a acontecer neste momento. Até agora “Praça Paris” fez um percurso incrível no Brasil, ganhou prémios no Festival do Rio de Janeiro e eu gostava que as pessoas cá também o vissem.
Do lado de cá do Atlântico interpretou Inês de Castro em “Pedro e Inês”…
O António [Ferreira, realizador] chamou-me para um casting, tivemos uma reunião e fomos para a frente com o projeto. Gostei muito de explorar este fio de ser uma personagem real e histórica mas com uma camada ficcional e transgressiva muito grande, que se relaciona não só com o lado histórico mas com o mito, com o livro [“A Trança de Inês”, de Rosa Lobato Faria] e com o ponto de vista criativo do António.
É muito interessante ver como é que a personagem atravessa os três tempos e existe de formas diferentes, condicionada por características diferentes em cada tempo, mas que mesmo assim, com este amor muito cruel que é tão intenso e grandioso, supera todos os obstáculos. Gostei do facto de ela existir nestas três dimensões.
Vê também: Let’s Talk #50 – António Ferreira, realizador de “Pedro e Inês”
https://www.youtube.com/watch?v=A6iMB2ENrm0
Para além do cinema, como se conjuga uma telenovela com todos os outros projetos?
“A Única Mulher” era muito longa e nesse sentido, para um ator que quer conciliar com outros trabalhos era mais difícil. Esta novela [“Valor da Vida”] é mais curta, são seis meses de projeto, vai acabar em Dezembro e tenho feito outros projetos ao mesmo tempo. Na verdade eu tenho feito uma performance no projeto da Christiana Jatahy, que é uma artista da cidade, uma brasileira que está cá com “Moving People”, dentro da perspetiva de dar voz a pessoas refugiadas que estão em Portugal e que querem partilhar as suas vidas. Entre a ficção e o documentário, a performance teatral e o cinema, contam as suas histórias. Estou a fazer isso durante a novela e fiz uma série brasileira para a HBO Brasil sobre o Santos Dumont [aeronauta e inventor brasileiro] que se chama “Mais Leve que o Ar” e vai estrear para o ano. Portanto, tenho feito coisas ao mesmo tempo que “Valor da Vida”, o que é bom.
O que gostas mais no trabalho de atriz?
É uma pergunta que dava para estarmos à conversa três horas. Mas eu acho que é esta espécie de privilégio ou quase que dádiva de podermos transmitir coisas aos outros. Somos veículos, colocamo-nos em situações imaginárias, sensitivas, reais, ficcionais, colocamo-nos em situações e evocamos coisas. Transmitimos algo ao público e as pessoas podem ser tocadas e acho que isso é um trabalho bastante bonito.
“Pedro e Inês” encontra-se em exibição nos cinemas, estando a poucos dias de se tornar no filme português mais visto do ano. “Praça Paris” estreou a 4 de Outubro.