Chadwick Boseman e Viola Davis brilham neste “Ma Rainey: A Mãe do Blues”, um drama baseado numa história verídica mais actual do que aparenta.
Ma Rainey é um ícone no mundo da música. Uma estrela fora deste planeta, uma visionária com uma voz tão característica e potente que arrebatava qualquer salão em que actuava. Portanto, era inevitável surgir uma caracterização dela no mundo do cinema.
Em “Ma Rainey: A Mãe do Blues” encontramos Leeve (Chadwick Boseman) e a banda de Ma Rainey, interpretada por Viola Davis, a ensaiar para uma sessão de gravações. Com todos os seus sonhos e desejos, Leeve criará muita tensão entre a banda e com Ma Rainey – tensão esta que não terá um bom resultado.
Tendo como base o argumento da peça de teatro vencedor de um Prémio Pulitzer pela autoria de August Wilson, este é de facto um argumento totalmente focado nos seus actores. Tem conteúdo e momentos com fartura para eles jogarem os dentes e fazerem um brilharete a cada oportunidade. E o elenco aproveita ao máximo cada segundo.
Viola Davis volta a mostrar que é uma das rainhas de Hollywood nos dias de hoje. Viola veste o papel de Ma Rainey com todo o orgulho que a lenda merece. Seja pela sua presença física portentosa ou pela sua voz grave e arranhada, esta sua Mãe do Blues é mais um papel em que Viola se entrega de corpo e alma e nos oferece uma performance avassaladora.
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E o que se pode dizer sobre Chadwick Boseman que ainda não foi dito? Neste “Ma Rainey” ele volta a mostrar a sua faceta camaleónica, mudando tanto a forma de falar como a sua postura física e o resultado é algo que ficará para a história. A energia de Boseman é contagiante, conseguindo fazer-nos rir e emocionar-nos num mero espaço de minutos. Esta última performance do actor será falada quando chegar a altura dos prémios e não será uma surpresa para ninguém se arrecadar um prémio póstumo, como ocorreu com Heath Ledger.
Porém, não se pode descurar as interpretações de todo o restante elenco. Mesmo não sendo muito vasto, todos conseguem colocar a sua própria impressão digital no nosso ecrã. É fascinante vê-los a driblarem o diálogo entre si, sendo que cada um tem o seu momento debaixo do holofote.
A realização de George C. Wolfe é vibrante e entusiasmante, conseguindo transportar-nos para Chicago dos anos 30 e o seu calor arrebatador de Verão. Com uma edição fluída e precisa, acompanhado por um guarda-roupa no ponto, tudo neste “Ma Rainey: A Mãe do Blues” contribuí para se tornar numa pequena cápsula do tempo e levar o espectador para outro tempo num espaço de 90 minutos.
Mas não vão ver o filme a pensar que se trata de uma biografia convencional e meramente expositória. “Ma Rainey” utiliza o cenário da gravação no estúdio com a Ma e o ensaio da sua banda para oferecer um olhar crítico para a sociedade e a relação racial entre a comunidade negra e a comunidade branca na América dos anos 30. O diálogo entre as personagens é carregado de significado e de paixão sobre este tema, com vários pontos de vista a serem puxados. Sem preocupações em darem a resposta certa sobre como se devem fazer as coisas, todos têm uma opinião a dar e não têm medo de a verbalizar.
Talvez a nota fora de tom presente neste “Ma Rainey” seja o facto de estar intrinsecamente ligada a uma peça de teatro.
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Seja pelo seu cenário reduzido ou pelos monólogos teatrais das personagens, existem várias componentes que não ficam totalmente bem transmitidos num cenário cinematográfico. Os actores conseguem dar asas ao seu papel nesses momentos, captando cada emoção em cada palavra, em cada gesto e cada olhar. Mas, com tantos monólogos, o ritmo do filme sofre devido a isso.
Para além disso, o final do filme pode ser um pouco desconcertante para alguns espectadores. É impactante, chocante até, e totalmente de acordo com a temática subliminar que o filme deseja transmitir. Mas também deixa em aberto a continuidade da história em si, sem chegar a uma conclusão definitiva do enredo. Parece que existiria mais filme, mas corta repentinamente para os créditos finais.
No fundo, “Ma Rainey: A Mãe do Blues” é um desfile de talento por parte do elenco. Sustentado por interpretações impressionantes por parte de Viola Davis e de Chadwick Boseman, esta nova aposta da Netflix é mais uma vitória e um excelente filme de despedida por parte de Boseman.
“Ma Rainey – A Mãe do Blues” já está disponível na Netflix.